quarta-feira, 23 de março de 2011

Campeonato Nacional de Escrita Criativa - Exercício V

Imagine que é um prato, pousado em cima de uma mesa. De repente, alguém o parte a meio. Escreva sobre isso – vestindo, sempre, a “pele” do prato.

            No outro dia decidi fazer contas à vida e fui ao registo civil. Fui mudar de nome.
Ando pelos cabelos, ou pelas bordas, com este nome repugnante que não lembra a ninguém. Não aguento mais.

            João Prato De Plástico?!? Sinceramente!

            Enfim, cheguei lá e perguntei se havia nomes bonitos. Disseram-me está já a sair. Estava tão embaraçado que nem fui capaz de verbalizar aquela asquerosidade de nome. Em vez disso, avancei com a certidão de nascimento. Perguntaram-me para que nome queria mudar. Eu disse que não queria mudar. Só queria que me cortassem o De Plástico.
            Agora sim! Agora sim! O que é que pode correr mal agora? Agora sou um dos Pratos! Tenho sangue azul!
            Hoje há sopinha de legumes. Tem é o cu quente: já estou em brasa. Estou vestido com Bacalhau à Brás. É o faminto do Carlos que vai comer de mim. O miúdo tem 7 anos mas come como se tivesse dois estômagos para saciar.  Tenho sempre um medo terrível quando ele me usa. O tacto nas mãos ainda não é apurado. Além disso, a lentidão com que ele come deixa-me nervoso e entediado. E isso faz-me bater o pé e tremer.
            - Mãe, vou pôr mais bacalhau!
Pegou em mim, cheio de brutidade, e assustou-se com o meu tiritar. Sempre sonhei fazer bungee jumping, pensei eu em alto.
            - MAS ERA COM PROTECÇÃOOOO!!!
Tarde demais para conselhos de utilização ou rótulos estampados com “FRÀGIL”… Logo no dia em que me tornei um prato de primeira qualidade fazem-me uma coisa destas. Em escassos instantes, a minha fase de Lua Cheia alterou para dois Quartos: um Crescente, outro Minguante. Não me consigo mexer. Acho que estou tetraplégico. Não me sentia tão triste desde que fui mudado de prateleira, para longe da Rita Prato de Plástico. A minha única esperança é a Super Cola 3. Mas, o que será de mim agora sem o esparguete a escorregar no meu colo, sem o cocorocó defunto do frango assado a sussurrar-me aos ouvidos, sem a piscina de óleo onde as batatas fritas se refugiam do verão…? Nunca quis que o meu nome fosse misturado com a primeira pessoa do verbo partir no indicativo. Eu era um prato, não um parto! Era… Tudo o que rogo agora, ao deus da cerâmica, é que me ofereçam um funeral justo. Não me abandonem aqui: Varram-me… Varram-me… Oxalá ainda fosse um De Plástico…!

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